Em seu artigo para o Olhar Digital, o colunista Valter Pieracciani fala sobre líderes, e seus estilos, que são determinantes para as empresas sobreviverem às profundas mudanças socioculturais pós-pandemia.
Nunca houve espaço no mundo dos negócios para falar de amor. Pelo contrário, todo mundo considera que é uma palavra que não pega bem nesse meio. Quando a ouvem no ambiente empresarial, muitos líderes esboçam um sorrisinho irônico que, quando muito, evolui para um incômodo e só em poucos casos se transforma em objeto de reflexão.
Muito bem, acredito que a revolução que estamos vivendo seja tão profunda que abrirá a mente e o coração dos líderes para uma busca aberta do amor. Amor dos clientes por seus produtos e serviços; amor entre integrantes de equipes; e, em especial, do time por seus líderes. Se você tem uma equipe, este é um bom momento para pensar na sua maneira de se relacionar com ela.
Pense na liderança como uma escala. Em uma extremidade estão os líderes sangue-frio, muito presentes em empresas industriais e bancos que fizeram muito dinheiro nos últimos anos. Eu disse dinheiro, não resultados, notou? Na outra extremidade situam-se os poucos líderes compassivos, apaixonados por gente e que lideram não pelo medo, mas pelo amor. Em que posição você se coloca? E seus superiores?
Mais uma pergunta: sob qual desses dois estilos de liderança você acha que a inovação prospera? Sim: líderes, e seus estilos, são determinantes para o ambiente, e ninguém mais tem dúvidas de que a capacidade de inovar é o que fará as empresas sobreviverem às profundas mudanças socioculturais pós-pandemia. A inovação pode estar em tudo o que se faz no interior de uma organização e, se a terra for fértil, são múltiplos os gatilhos para ativá-la. “De toda parte, inclusive da ‘implantação’, emanam pequenas decisões que podem se tornar grandes estratégias”, disse uma vez H. Mintzberg, acadêmico canadense, autor de diversos livros sobre gestão e organizações.
Em home office e em plena revolução digital, ficou mais difícil liderar com base no poder e na força. A avaliação das equipes por seus superiores está menos suscetível a fatores clássicos, como o número de horas-assento no local de trabalho, ou a questões subjetivas e de relacionamento que sempre existiram. Agora os líderes têm que provocar engajamento verdadeiro, inspirar a distância e fazer com que cada colaborador dedique ao trabalho o melhor de si e sua energia mais vibrante, componentes essenciais para que a inovação nasça e prospere. Fazer com que a organização funcione como um só sistema no qual as partes (departamentos) trabalhem juntas de maneira natural e harmoniosa – ainda que cada integrante do time esteja na própria casa. Deixar de olhar para as empresas como organogramas e reconhecer que são sistemas orgânicos.
Escolas de MBA e muitas empresas não estão prontas para ensinar essa forma de liderar. Na maioria dos casos em que se ouve falar dela, ao se averiguar melhor descobre-se que tudo não passa de discurso vazio. Os novos tempos requerem líderes dedicados, humildes, capazes de apoiar e de provocar paixão nos integrantes de seus times. Talvez a descoberta da nossa vulnerabilidade, o luto pelos que se foram e a ascensão de um número maior de mulheres de grande sensibilidade aos cargos de liderança possam enfim encerrar a era da arrogância em nome do poder.
Quem sabe tenha morrido o líder que “destrói” fornecedores e parceiros para depois dar uma de bacana mostrando os resultados e fazendo doações a quem precisa. O líder sensível cria valor na cadeia em que está inserido. Ele sabe que o cliente nem sempre quer lidar com robôs, e que nenhuma máquina será capaz de assumir responsabilidades ou dar amor. E cá estamos de volta a Mintzberg e ao conceito do líder intuitivo, que inspira, é passional e cria possibilidades infindáveis.
Considerar o poder das emoções no dia a dia das empresas talvez proporcione uma expansão da pequena parcela que utilizamos da capacidade de nossos cérebros. Quiçá sejamos menos parecidos com máquinas programáveis e mais artistas da gestão. Inspirados e operando no modo amor, é possível que coloquemos nosso miniuniverso, com seu um bilhão de galáxias (neurônios), a serviço de criar produtos e soluções encantadoras.
A capacidade de inovar é uma característica única dos seres humanos e tem a ver com energia vital. Na nova era em que viveremos, os líderes compreenderão sua gigantesca responsabilidade de atuar sobre esse dom divino da inovação. Ouvirão mais seus corações e abandonarão de vez formas de liderar que migraram dos exércitos para as empresas. Quem sabe encontremos no país mundialmente famoso pela alegria e pelas emoções de sua gente um “modelo empresarial Brasil” de desenvolvimento econômico cujas bases não sejam apenas o lucro, mas a combinação harmoniosa de pessoas e criação de valor. Novos líderes comandarão a verdadeira revolução de nossos tempos no mundo empresarial. E será pelo amor.
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