Com o avanço da tecnologia e a adesão de diversas ferramentas facilitadoras, a área de Recursos Humanos tem uma responsabilidade grande e se tornou uma peça fundamental para o sucesso das organizações. Em seu artigo, Norberto Chadad diz que, mais do que nunca, o RH não pode ser apenas um executor de ordens, mas um conselheiro valioso para recomendar aos empregadores a adoção de tecnologias que funcionem a partir de orientações justas, quando uma decisão pode afetar as relações trabalhistas. Confira!
Sistemas de gestão cada vez mais sofisticados estão retirando dos encarregados do RH das empresas, aquele antigo trabalho braçal de preenchimento de formulários e relatórios, e produção de gráficos. Fala-se muito hoje, em RH 4.0, com o departamento automatizado que não perde tempo com procedimentos e processos rotineiros e, com isso, conquista-se mais horas para aplicar inteligência humana sobre questões estratégicas como, por exemplo, identificar desmotivação de equipes e encontrar possíveis soluções.
A área de Recursos Humanos tem por missão atender as demandas da diretoria para contratar, testar, dar treinamento e acompanhar a movimentação de funcionários ao longo de sua trajetória dentro de uma empresa. Indicadores de desempenho, controle de competências, acompanhamento de frequência, compliance ao e-Social, bônus, tudo isso está a cargo de ferramentas tecnológicas disponíveis e personalizadas.
Mas há um componente pouco simpático que muitas vezes é atribuído ao RH, que trata da vigilância sobre os funcionários.
Engana-se o leitor que pensa que é procedimento extinto o ato da empresa de fazer revista visual nas bolsas, mochilas e sacolas de funcionários, à entrada e saída do trabalho, para verificar a possibilidade de roubo ou descaminho de produtos. A Justiça do Trabalho já garantiu em diversas ações esse direito da empresa, inclusive em uma decisão bem recente, de fevereiro de 2021, do Tribunal Regional de Trabalho da 2ª região. A ressalva que se faz está baseada na Lei nº 9.799, de 26 de maio de 1999, que atualizou artigos da velha CLT, de 1943. Esta lei proíbe revista íntima. O funcionário não deve ser tocado e a revista tem que ser apenas visual.
Esta busca pela proteção ao direito fundamental à propriedade, que é poder diretivo do empregador, é muitas vezes realizada de maneira excessiva. As inspeções são feitas muitas vezes por agentes truculentos, que ofendem os direitos de personalidade do trabalhador, como intimidade e vida privada. Não existem, na lei, limites à atuação desses agentes do empregador. Porém, vamos lembrar que o papel do RH é justamente prever ou eliminar o conflito existencial no âmbito das relações privadas.
Por qual razão estamos tratando desse assunto num artigo dedicado a relacionar a tecnologia com o trabalho do RH? Simplesmente porque numerosos avanços tecnológicos podem oferecer aos gestores de RH alternativas que substituam a indecorosa e vergonhosa revista. Estamos falando de esteiras de raio-X, de drones, de sistemas de câmeras e, principalmente, de treinamento.
Há outras questões embaraçosas que podem ser minimizadas pela tecnologia. Existe uma expressão corrente na área de RH “inflar o currículo”, que é usada quando o profissional extrapola para mais as suas competências. Nem sempre o recrutador tem conhecimentos específicos para aferir se um candidato a uma função de planejador de mídia, por exemplo, domine as ferramentas online e off-line. Para conferir a capacidade, não há um teste – estas habilidades têm que ser verificadas na prática, e, se não são reais, representarão perda de tempo e de dinheiro para o empregador, e o RH falhou. Qual a saída? Hoje, não basta ser generalista, é preciso ser sistemista: conhecer os sistemas que abraçam a tecnologia. Se o candidato entende o sistema como um todo, então sim, poderá ser considerado um híbrido. Para esta aferição, o RH vai buscar suporte na pessoa que requisitou a vaga, inclusive para compor o questionário de habilidades ou, se necessário, participar da entrevista.
A relação entre o trabalho e a tecnologia é antiga. Já ocorreu com as ferramentas usadas na agricultura, ocorreu depois com os teares na indústria têxtil, com os computadores mais tarde, e não temos sequer ideia do que já está sendo concebido com a tecnologia nas nuvens e as nanotecnologias. São processos que economizam tempo e esforço, é verdade, mas que não substituem a inteligência humana.
É quase impossível não lembrar de Alvin Toffler, no seu livro “Powershift: as mudanças do poder” quando disse que o mais importante fato econômico de nossa era tem sido a ascensão de um novo sistema para criação de riqueza, não mais nos músculos, mas na mente. Para nós, observadores do século XXI, parece uma frase lógica, mas na época em que foi escrita, era quase uma antevisão dos nossos tempos atuais.
O que pretendo dizer é que, embora os sistemas tecnológicos apresentem pontos positivos, os direitos dos trabalhadores estão sendo flexibilizados já há vários anos, e as diferenças econômicas e sociais, potencializadas. Os departamentos de RH precisam atentar para que não haja redução na garantia e promoção de direitos dos trabalhadores, inclusive para não perpetuar a exclusão social. Qualquer sistema tecnológico obedece a comandos – dados por pessoas. Se os comandos forem injustos, o processo será injusto e não é o caso de culpar a tecnologia.
O RH não pode ser apenas um executor de ordens, mas um conselheiro valioso para evidenciar aos empregadores – gestores e conselhos deliberativos ou consultivos – quando uma decisão pode afetar para pior as relações trabalhistas e para recomendar o reconhecimento do trabalho por meio de tecnologias que funcionem a partir de orientações justas.